Como se a empresa em que se trabalha fosse um planeta. Até era.
Isto de ver nascer o Sol na empresa é muitas vezes motivo de orgulho de muitas pessoas. Orgulho, gabarolice, sei lá.
Ver lá nascer o Sol não significa que se tenha chegado muito cedo. Ver nascer o Sol é mais do que ver amanhecer. É testemunhar o momento em que aparece no horizonte vindo das trevas. É mais do que o ver subir no céu. Significa que se trabalhou de noite. E isto de se trabalhar de noite para quem não faz turnos e só devia trabalhar de dia é um estandarte a transportar.
Vi nascer o Sol quando tive uma release de código que tinha que ser feita durante a noite e que durou até de manhã. Trabalhei de noite porque era preciso. Trabalhei de noite no escritório porque era assim que se trabalhava antes de se perceber que de casa, afinal, também se trabalha. Até de noite, vejam lá. Perceber, aceitar, render-se à evidência ou à necessidade. Era isso ou parar.
Trabalhei muitas outras vezes durante a noite por razões semelhantes mas nessas, felizmente, sem ver nascer o Sol.
Também vi amanhecer muitas vezes no mesmo sítio. Tantas. O Sol a subir no horizonte e a espelhar no Tejo a uma hora em que só eu, a senhora da limpeza e mais um colega lá estávamos. A senhora da limpeza que ora cantava, ora falava ao telefone mas que se rendia ao silêncio quando chegávamos. Mas isto não era estandarte digno de se transportar. Ninguém quer saber de quem chega cedo. Porque ninguém vê (excepto, claro está, a senhora da limpeza e um ou outro lunático que também goste de chegar cedo). Em Portugal o que importa é sair tarde. Porque sair tarde aparentemente é sinónimo de se trabalhar mais. Mentira. Tão mentira.
Também vi o Sol pôr-se muitas vezes, mesmo no verão. Às vezes era preciso, às vezes tinha que ser, às vezes fui muito parva em ficar até tão tarde. Tarde ao ponto de precisar fazer contas à vida: "Senão apanhar o autocarro das 20h40, o próximo é às 21h20"... e depois disso sabe Deus.
E não me esperava uma viagem de 5 ou 10min. Com muita sorte e sem trânsito algum, 30m. Com menos sorte ou algum trânsito, 45m. Sem sorte nenhuma, provavelmente graças a um acidente, mais de 1h. Fora o tempo até chegar efetivamente a casa.
Hoje vejo amanhecer em casa (se me apetecer também vejo nascer o Sol. Vejo entardecer em casa, o Sol pôr-se, e posso estar descansada porque, mesmo que já seja noite serrada, não tenho nenhum autocarro para apanhar.
Em casa ninguém pergunta se vamos almoçar a casa. Já lá estamos. Como na empresa ninguém perguntava se tínhamos caído da cama. Raramente.
Já vi o Sol nascer no trabalho. Mas prefiro vê-lo em casa.
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